Quando Igor Gutierrez Freitas, filho do tetracampeão mundial de boxe Acelino Popó Freitas, e o empresário Rodrigo Rossi Calamo foram formalmente apontados como suspeitos da Ministério Público do Paraná (MP‑PR), o Brasil recebeu mais um alerta sobre a fragilidade da manipulação de resultados no futebol. Na sexta‑feira, 12 de setembro de 2025, o Operação Derby foi deflagrada pelo Núcleo de Londrina do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco), culminando em quatro mandados de busca e apreensão em Salvador (Bahia) e Itapema (Santa Catarina), além de buscas pessoais contra os dois empresários.
A iniciativa do Gaeco segue uma série de investigações que, desde 2022, têm desvelado tentativas de aliciamento de jogadores nas divisões inferiores do Campeonato Brasileiro. O promotor de Justiça Jorge Fernando Barreto da Costa explicou que a operação visa "coibir a prática de corrupção que mina a credibilidade do esporte nacional". As diligências foram realizadas em parceria com as polícias civil e federal dos estados de Bahia e Santa Catarina, evidenciando a cooperação interestadual necessária para combater redes que operam à distância.
Conforme apurado pelo MP‑PR, Igor e Rodrigo abordaram três atletas do Londrina Esporte Clube aproximadamente uma hora antes da partida da terceira rodada da Série C, disputada em 26 de abril de 2025 contra o Clube Maringá. O plano era simples: oferecer R$ 15 mil a pelo menos um dos jogadores para que fosse forçado um cartão amarelo até os 27 minutos do primeiro tempo.
O contato inicial partiu das redes sociais, onde Igor se apresentou como "representante com acesso direto às maiores empresas do mercado nacional" e prometeu "projetos estratégicos, ativações e patrocínios". Apenas um dos atletas respondeu, mas recusou a proposta e imediatamente relatou o caso à diretoria do Londrina, que encaminhou as informações ao Gaeco.
Durante as investigações, autoridades tiveram acesso a áudios enviados por Rodrigo a um dos três atletas – conhecidos como "tubarões" por causa de sua postura agressiva em campo – nos quais se descrevia detalhadamente o método de pagamento e o tempo exato para o cartão. Esses registros comprovaram o modus operandi da dupla: uso de mensagens diretas, promessa de dinheiro rápido e tentativa de manipular um evento de tempo limitado para evitar suspeitas.
O Londrina Esporte Clube divulgou nota oficial elogiando a postura dos jogadores, destacando que a recusa ao suborno reforça o compromisso do clube com a integridade do esporte. "A atitude dos atletas mostrou que o futebol debaixo das arquibancadas está longe de ser corrompido", afirmou o presidente do clube, cuja identidade foi mantida em reserva por questões de segurança.
Já a imprensa local recolheu declarações do empresário Rodrigo Rossi Calamo, que não se manifestou, enquanto representantes de Igor ainda não foram localizados. A reportagem do Estadão tentou contato, mas sem sucesso, o que alimenta especulações sobre possíveis pressões externas aos suspeitos.
Esta é a segunda vez em menos de um ano que a Série C tem seu nome associado a esquemas de manipulação. Em março de 2025, outro clube da competição foi alvo de tentativa de compra de resultados, mas a proposta foi igualmente rejeitada. Especialistas em direito esportivo, como a advogada Mariana Duarte, apontam que a recorrência desses casos revela falhas nos mecanismos de monitoramento da Confederação Brasileira de Futebol (CBF), que ainda depende de denúncias internas para iniciar investigações.
Além disso, a Operação Derby demonstra que as autoridades estão capazes de rastrear influenciadores digitais que atuam como intermediários. O uso de redes sociais para chegar até jogadores representa uma nova frente na luta contra o crime organizado no esporte, exigindo treinamento específico para atletas e gestores.
O Ministério Público do Paraná informou que continuará a coletar depoimentos e analisar possíveis ligações de Igor e Rodrigo com outras apostas esportivas ilegais. A expectativa é que novos mandados de busca sejam expedidos em cidades onde os suspeitos mantêm escritórios de representação. Enquanto isso, o Gaeco mantém vigilância sobre as partidas da Série C, com foco especial nas equipes que apresentam histórico de jogadores jovens e vulneráveis a propostas financeiras rápidas.
Se as acusações se confirmarem, Igor Gutierrez Freitas poderá enfrentar processo criminal por tentativa de aliciamento, com pena prevista de até quatro anos de prisão, conforme o artigo 317 do Código Penal. Rodrigo Rossi Calamo, por sua vez, pode ser enquadrado como coautor, o que aumentaria a gravidade da sentença.
Para o torcedor médio, o caso reforça a necessidade de prestar atenção não só ao que acontece dentro de campo, mas também ao que rola nos bastidores. A recusa dos jogadores em aceitar suborno - e a rápida denúncia - mostram que o espírito de competição ainda tem defensores dispostos a proteger a integridade do jogo.
A proposta visava garantir que um dos três jogadores do Londrina recebesse um cartão amarelo antes dos 27 minutos do primeiro tempo, facilitando possíveis apostas que dependiam desse evento específico.
Os próprios atletas recusaram a proposta e relataram o caso à diretoria do Londrina Esporte Clube, que imediatamente repassou as informações ao Gaeco. A partir daí, foram coletados depoimentos e áudios que comprovaram a abordagem.
Igor usava suas redes sociais para se apresentar como empresário de alto nível, citando projetos de patrocínio e parcerias com grandes marcas, embora não haja evidência de que ele tenha experiência prévia em gestão esportiva.
A Confederação tem reforçado o programa de integridade, promovendo treinamentos para jogadores e dirigentes e ampliando a cooperação com órgãos de segurança, mas ainda depende de denúncias internas para acionar investigações aprofundadas.
Caso as acusações sejam confirmadas, ambos podem responder por tentativa de aliciamento (art. 317 do Código Penal) e, dependendo do desdobramento, enfrentar até quatro anos de prisão, além de sanções civis e eventuais proibições de atuar no mercado esportivo.